Desde 1994, socioambiental se escreve junto. A palavra, que até então não era usual, foi cunhada pelo Instituto Socioambiental, o ISA, organização da sociedade civil fundada por pessoas atuantes na defesa dos direitos indígenas e do meio ambiente.
O ISA e o socioambientalismo surgem a partir da visão e união de colaboradores do CEDI, o Centro Ecumênico de Documentação e Informação, e do NDI, o Núcleo de Direitos Indígenas, além de membros da SOS Mata Atlântica. O Brasil vivia, então, um momento de consolidação democrática e digeria o impacto da Rio-92, conferência da ONU realizada em 1992.
Já estava evidente, em um país emergente e amazônico, que a proteção e o cuidado que povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas e populações tradicionais têm com seus territórios são centrais para o desenvolvimento sustentável do país. Desde sua fundação, o ISA passou a desenvolver soluções para apoiar as comunidades na proteção de seus territórios, no fortalecimento de suas culturas e saberes tradicionais e no desenvolvimento de suas economias.
Para tanto, o ISA promove, em suas regiões de atuação – as bacias dos Rios Negro, Xingu e Ribeira de Iguape –, uma relação “raiz-antena”. Em via de mão dupla, conectam-se as raízes, compostas por comunidades locais e territórios, com as antenas, que orientam decisões políticas, principalmente na esfera nacional. É um desafio em constante atualização. O país está sujeito ao agravamento dos impactos das mudanças climáticas e terá de enfrentar as suas diferenças sociais e econômicas. Somente com a formação contínua de alianças e redes teremos um Brasil Socioambiental.
A visibilidade do trabalho das comunidades faz parte dessa teia. O ISA, desde sua fundação, apostou na necessidade de registrar, em um trabalho minucioso de documentação e informação, a presença e a luta dos povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos e comunidades tradicionais.
Parte desse trabalho resulta de parcerias com cineastas, profissionais de fotografia, jornalistas, antropólogos e pesquisadores capazes de multiplicar em campanhas de comunicação e nas telas de cinema a beleza dos modos de vida nas aldeias, comunidades e quilombos, bem como as ameaças e pressões nos seus territórios.
Aos poucos, o ISA desenvolveu seu acervo audiovisual, hoje organizado e depositado em servidores próprios, para melhor contar uma parte da história do país ainda pouco difundida. Combinando o apuro técnico dos pesquisadores da organização, que estabeleceram e estabelecem parcerias históricas em relações de longo prazo com as comunidades, e a atuação atenta de profissionais sensíveis e engajados do audiovisual, as imagens captadas junto às comunidades ganharam novas camadas de significado que contribuem diretamente com a luta política nos corredores de Brasília.
São vários os exemplos de materiais audiovisuais que conseguiram, em poucos minutos, apresentar como projetos de lei e decisões judiciais impactariam diretamente os direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais, revertendo ou postergando ameaças diretas aos seus modos de vida. Para isso, a presteza e a credibilidade da produção de dados da organização sempre foi peça fundamental.
O ISA tem em seu DNA uma produção cartográfica de excelência. Com o apoio de equipes dedicadas a mapear e monitorar a situação das Terras Indígenas e Áreas Protegidas no Brasil, as produções ganharam em precisão ao determinar, em tela, os limites dos territórios e o avanço de vetores do desmatamento, como a agropecuária, a mineração e as obras de infraestrutura em seus entornos.
Assim, depoimentos de lideranças sobre a violência contra suas vidas passaram a ser também ilustrados por dados e indicadores fundamentais para comunicar ao público o percurso doloroso e de muita resistência que contorna a luta por seus direitos territoriais. Estradas, barragens e o avanço do desmatamento, com dados acumulados ano a ano, aparecem pontuados nas produções e demonstram o caminho do desenvolvimento predatório, a qualquer custo, que atropela direitos constitucionais. Em outra frente, as percepções de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais sobre as mudanças climáticas também passaram a ser evidenciadas em produtos audiovisuais realizados pelo ISA e seus parceiros.
Os impactos, sentidos primeiro por essas populações, são alertas que há décadas resultam em incêndios florestais, perda de roças, destruição da biodiversidade e insegurança alimentar. As produções, que contam histórias e apresentam esses cenários, fomentaram uma caminhada que repercute até hoje ao formar realizadores do audiovisual dentro das comunidades.
Ouvir e assistir aos materiais produzidos por comunidades indígenas, ribeirinhas e quilombolas é urgente e necessário diante das catástrofes atuais, que destroem vidas de norte a sul do país. Eles são os leitores das paisagens em seus territórios, e cada detalhe, cada alteração importa. Se entendemos que a comunicação e a palavra podem ser uma flecha para transformar, a comunicação indígena, ribeirinha e quilombola mostra que outro mundo é possível.
O ISA apoia a formação de redes de comunicadores locais que produzem conteúdo para evidenciar a força de suas culturas e seus saberes, bem como apresentar ao mundo, por quem vive na pele, os impactos das pressões sobre seus territórios. A força de suas palavras avança, conquista seguidores, influencia decisões e conecta mundos. São coletivos que tomam decisões em arenas de profundas discussões.
Nesta programação da 13ª Mostra Ecofalante de Cinema, produções antigas e recentes do ISA e seus parceiros realizadores apresentam movimentos que fazem parte da história indígena, ribeirinha e quilombola no país. Estão em tela materiais importantes que merecem maior audiência, contando histórias no Rio Negro, no Xingu e no Vale do Ribeira. São exemplos de resistência e amostras de ferramentas de luta por um país que, enfim e definitivamente, respeite os direitos de povos e comunidades tradicionais. Assista, compartilhe e se engaje na luta por um Brasil socioambiental.