por Sérgio Alpendre
Pensar nas linhas de força no cinema de Werner Herzog não é tarefa fácil. Com carreira de meio século, mais de meia centena de longas-metragens e variações de registros que o acompanham desde o início, qualquer historiador sente-se intimidado e ao mesmo tempo desafiado. Pode-se apontar o caráter obsessivo de grande parte de seus personagens (de Aguirre a Fitzcarraldo, mas também personagens de filmes como Strozsek, No Coração da Montanha, Invencível, O Diamante Branco, O Homem-Urso, Vício Frenético), uma obsessão que não raramente leva à loucura (os delírios de Aguirre, sozinho com os macacos e a morte na jangada são inesquecíveis) e é herdada claramente das obsessões do homem que está por trás da câmera. Ou o fato de que alguns deles, talvez os mais notórios, apresentem um grau elevado de autismo (Sinais de Vida, Coração de Cristal, Stroszek, Woyzeck, Nosferatu, My Son My Son What Have Ye Done), ou sejam vítimas de um cruel e desumano isolacionismo causado por deficiência física ou mental (Últimas Palavras, Terra do Silêncio e da Escuridão, O Enigma de Kaspar Hauser). Pode-se, também, como nove entre dez críticos que se debruçam sobre sua obra, falar da potente relação do humano com a natureza, e da maneira como essa relação por vezes envolve um confronto extremo e audacioso (novamente Aguirre, a Cólera dos Deuses, Fitzcarraldo e O Homem Urso, mas também Fata Morgana, La Soufrière, Onde Sonham as Formigas Verdes, Lições da Escuridão, Juliane Cai na Selva, Diamante Branco, Encontros no Fim do Mundo e A Caverna dos Sonhos Esquecidos). E pode-se, de modo mais sucinto, resumir toda sua obra cinematográfica de ficção (e boa parte dos documentários) a uma única e taxativa palavra: loucura. De que outro modo, que não louco (no bom sentido, porque no sentido artístico), classificar o diretor que faz Também os Anões Começaram Pequenos (1970), um dos filmes mais insanos de que se tem notícia? De que modo entender sua atração por atores que compartilham com ele o mesmo tipo de loucura, de ir até o fim em seus papéis e de agir como verdadeiros maníacos na frente da câmera: após Klaus Kinski, podemos lembrar de Peter Blogle (o personagem que enlouquece em Sinais de Vida chama-se Stroszek), Bruno Ganz, Nicolas Cage e Michael Shannon, além da atração pelo trabalho de Bruno S, ator que serve perfeitamente a Herzog em dois filmes marcantes (O Enigma de Kaspar Hauser e Stroszek).
Todos esses filmes citados são apenas, a meu ver, os principais a lidar com cada uma dessas características. Mas sua carreira é grande o suficiente para termos a certeza de que há filmes importantes que não foram mencionados, por vezes até filmes que conjuguem todas as características ao mesmo tempo. Como este texto, como nenhum outro, não pode ter a ambição de ser conclusivo, sei que vale correr o risco (incluindo aí o risco de aborrecer o leitor com as menções) para oferecer algumas pistas das linhas de força que percorrem sua obra cinematográfica.
Há ainda uma outra característica, presente em alguns dos mais importantes de seus filmes de ficção: a crueldade. Truffaut agrupou textos de André Bazin em um livro chamado O Cinema da Crueldade, pensando em uma característica comum aos cineastas estudados naqueles textos. Mas Bazin não imaginava que depois de sua morte um artista se encaixaria perfeitamente nessa definição. Pensemos na crueldade com que são representados os anões de Também os Anões Começaram Pequenos, e também na crueldade envolvida no processo de filmagem, em que um anão está amarrado enquanto os vidros de uma janela se despedaçam acima dele, num típico exemplar do “tudo pela arte” daqueles tempos malucos. Ou a relação extrema que desenvolveu durante anos com outro doido de pedra genial, Klaus Kinski. Ou mesmo na crueldade presente na dramaturgia, em que alguns personagens agridem e abusam, como vilões de dramas até certo ponto maniqueístas, de personagens mais fracos.
Então ficamos assim: loucura e crueldade são duas boas palavras para definir a filmografia de Herzog, ou parte dela. Mais que Federico Fellini ou Marco Ferreri, Herzog soube incorporar sua própria loucura no fazer cinematográfico, a ponto de tornar alguns de seus filmes quase ensaios sobre a loucura. Tanto quanto Luis Buñuel ou seu companheiro geracional Fassbinder, Herzog soube dar voz à crueldade do mundo e da sociedade de modo a enredar seus personagens em teias que cerceiam ou mesmo aprisionam, privando-os de fazer outra coisa senão a mais entranhada e não resolvida obsessão. É muitas vezes uma forma de fuga. Essas características são levadas a cabo por uma inteligência rara, não desprovida de rigor e convicções. Para Herzog, como para qualquer outro cineasta de fato rosselliniano, filmar é um modo de entender o mundo e as pessoas. E por mais que a filiação a Rossellini seja óbvia em alguns momentos, forçada em outros e difícil de precisar na maioria deles, há nos dois cineastas a consciência de que a natureza é uma força motivadora de conflitos que não devem ser ignorados.
Os caminhos do cineasta
O primeiro curta de Werner Herzog, Hercules, é de 1962, mesmo ano do célebre Manifesto de Oberhausen, capitaneado por Kluge e apoiado por diversos curta-metragistas jovens e desejosos de mudanças no cinema alemão, tido por eles como cadavérico, ultrapassado. O mote ficou conhecido e serviria de slogan para futuros projetos: “O cinema do papai está morto, viva o novo cinema alemão” – segundo a tradução que ainda ecoa em minha mente, vista no saboroso e instrutivo documentário Entre o Sonho e a Realidade, exibido na TV aberta brasileira nos anos 1990. O manifesto ainda demoraria para gerar frutos. Estes só surgiriam em meados da década de 1960, notadamente com três primeiros longas de diretores da geração Oberhausen: Os Não-Reconciliados (1965), de Jean-Marie Straub e Danièlle Huillet, Despedida de Ontem (1966), de Alexander Kluge, e O Jovem Torless (1966), de Volker Schlondorff. Ainda em 1966, Rainer Werner Fassbinder realiza seus dois primeiros curtas, e no ano seguinte seria a vez de Wim Wenders realizar o seu, firmando de vez essa geração e o Novo Cinema Alemão, cujos nomes de ponta acabaram sendo Fassbinder, Herzog e Wim Wenders.
Após um hiato de cinco anos em que filmou o não lançado e não visto Spiel im Sand (1964), a carga da provocação ressurge fortalecida com os curtas A Defesa sem Precedentes da Fortaleza Deutschkreuz (1967), em que o narrador é completamente maluco, com sua risada maquiavélica, uma espécie de preparação para o primeiro longa, Sinais de Vida (1968), e Medidas Contra Fanáticos (1969), que contrapõe um velho obcecado pelo cuidado com os cavalos, como se só ele soubesse cuidar dos animais, aos profissionais responsáveis pela tarefa.
O terreno estava devidamente preparado para os dois longas que chamaram definitivamente a atenção da crítica: Também os Anões Começaram Pequenos (1970) e Fata Morgana (1971), ambos reveladores de duas das facetas mais brilhantes de Herzog: a loucura com que cerca personagens e filmagens e a maneira inventiva de “filmar o real” (expressão imprecisa, normalmente usada como atalho, mas que de alguma forma se aplica ao diretor). Em seguida, após mais dois documentários, um deles para a TV, realiza seu filme mais celebrado, Aguirre, a Cólera dos Deuses (1972), tornando-se um dos maiores diretores europeus da época. Alguns longas de ficção confirmariam essa reputação: O Enigma de Kaspar Hauser (1974), Coração de Cristal (1976), Stroszek (1977), Woyzeck (1979), Nosferatu (1979) e Fitzcarraldo (1982) formam, com Aguirre, o grupo de filmes mais difundido e discutido de sua filmografia. E cada qual com sua magia por trás. Aguirre, a Cólera dos Deuses traz pela primeira vez a relação insana entre o ator e o diretor; O Enigma de Kaspar Hauser traz Bruno S como revelação; Coração de Cristal é acompanhado da história de que quase todos os atores no filme haviam sido hipnotizados (parece um caso de “imprima-se a lenda”, mas Herzog sustenta a história ainda hoje); Stroszek tornou-se famoso após supostamente ter motivado o suicídio de Ian Curtis, da banda de pós-punk Joy Division (uma conexão tortuosa com a música); Woyzeck tem a marcante abertura burlesca e a inesquecível cena de assassinato em câmera lenta; Nosferatu relia com muita personalidade a novela de Bram Stoker e ao mesmo tempo o Nosferatu de Murnau, marco da UFA nos anos 20; por fim, Fitzcarraldo marcou época por representar ao mesmo tempo um sinal de declínio do cinema alemão (a despeito de suas inegáveis qualidades) e a obsessão de Herzog sendo expandida mais uma vez para seu protagonista. Em 1977, Herzog ainda viajou à ilha caribenha de Guadalupe para captar a véspera de uma tragédia no belíssimo e esquecido La Soufrière, média em que se assume fazendo uma reportagem, mas entrega puro cinema (enquanto muitos documentaristas atuais fazem reportagem pensando fazer cinema). Esse média é mais um ótimo exemplo de que não se deve desprezar a produção documental que Herzog fez entre suas brilhantes ficções do período 1968-1982.
Após Fitzcarraldo, Herzog entrou no bojo da decadência do cinema alemão junto com Wim Wenders, em grande parte porque ambos se internacionalizaram, mas também pelo falecimento de um de seus maiores talentos, Fassbinder. Os filmes mais famosos desse período – Onde Sonham as Formigas Verdes (1984) e Cobra Verde (1987) – são longas de ficção (contaminados, como sempre, pelo documentário e filmados numa época em que Herzog realizou também alguns documentários para a TV), que dão sequência e corpo a um pendor para o mais fácil exotismo, e são apenas sombras do que Herzog fez de melhor. Se Onde Sonham as Formigas Verdes ainda respira um certo frescor graças ao interesse de Herzog pelos aborígenes, Cobra Verde, filmado principalmente em Gana, sucumbe a um deslumbre com a diversidade cultural que Herzog sempre conseguiu evitar. Não é um mau filme, pois Herzog controla a forma como poucos, mas é provavelmente seu longa mais discutível até então. Melhor, para continuarmos no continente africano, agora no Saara, é Wodaabe (1989), “menos um documentário sobre uma tribo africana específica do que uma história sobre beleza e desejo”, diz o próprio Herzog. A influência confessa de Jean Rouch nunca foi tão clara, mas Herzog, com razão, assume seu lado esteta para clamar sua diferença com os cineastas etnográficos.
Os anos 1990 trazem um Herzog mais afoito para recuperar a força dos anos 70. E também um foco ainda maior no documentário. Nessa década, realizou só um longa de ficção: No Coração da Montanha (1991), sobre dois alpinistas competitivos e obsessivos. Nos anos 80 foram três ficções, já uma considerável redução em relação aos anos 70, quando realizou sete longas de ficção (contando Também os Anões Começaram Pequenos, de 1970). A volta à forma vem definitivamente com Lições da Escuridão (1992), documentário de 54 minutos sobre os poços de petróleo do Kuwait em chamas durante a Guerra do Golfo, num dos maiores atentados à natureza movidos pela ganância capitalista. Vinte e um anos após Fata Morgana, quinze após La Soufrière, Lições da Escuridão surge com a mesma força nas imagens, a mesma coragem para se colocar no olho do furacão e o mesmo pendor para a abstração a partir de fenômenos naturais, e recoloca Herzog no panteão do grande cinema autoral contemporâneo.
A partir daí, a despeito de ótimas obras de ficção como O Sobrevivente (2006) e Vício Frenético (2009), são documentários como Meu Melhor Inimigo (1999), sobre sua relação conflituosa com Klaus Kinski, O Diamante Branco (2004), que traz um homem obcecado por desvendar o segredo de uma gruta escondida atrás de uma cachoeira por meio de um balão, O Homem-Urso (2005), sobre um cientista que é engolido por um urso, Encontros no Fim do Mundo (2007), que acompanha uma expedição à Antártida, e A Caverna dos Sonhos Esquecidos (2010), sobre uma caverna encontrada por uma expedição francesa, num dos raros grandes usos do 3D, que chamam a atenção da crítica e do público.
O estilo Herzog
“Detesto perfeccionistas atrás da câmera, essas pessoas que passam horas para preparar um único plano. Preciso de pessoas que realmente vejam as coisas, que as sintam como elas são, e não quem fica preocupado em conseguir as imagens mais belas possíveis”.
De certo modo, a declaração acima, que poderia ter saído da boca de um Rossellini ou um Buñuel, explica o modo de Herzog dirigir. Ficção como se fosse documentário. O que não elimina a possibilidade contrária: documentário como se fosse ficção, dada a loucura e o pendor para o delírio presentes em sua carreira. E, no entanto, como são belas suas imagens. Belas, também, plasticamente falando. O estilo de Herzog não é simples. Trata-se de um diretor complexo e versátil, que transita por vários estilos para formar um único, estilhaçado e condizente com o seu modo de ver o mundo. Acima de tudo, cada filme pede um estilo, seja com atores hipnotizados como em Coração de Cristal, seja com o rigor formal da câmera de Jorg Schmidt-Reitwein ou com a câmera mais solta de Thomas Mauch. Passemos brevemente por alguns traços desse estilo.
Da natureza à abstração. A areia em Fata Morgana é mostrada de uma câmera móvel, e após um tempo vira uma abstração, como se Herzog pintasse uma tela, uma pintura não figurativa, mas que combina cores e formas com tal maestria que podemos esquecer que se trata da realidade filtrada por uma câmera atenta, que seleciona do mundo um espaço. É o mesmo que vemos em Lições da Escuridão, com os poços de petróleo em chamas na primeira Guerra do Golfo, um desastre natural causado pela ganância do homem, transformando-se em belíssimas pinturas expressionistas. Ou no começo de cada longa da trinca poderosa que se abre com Aguirre, a Cólera dos Deuses, prossegue com O Enigma de Kaspar Hauser e termina com Coração de Cristal, numa combinação de paisagens naturais que remetem ao romantismo do pintor alemão do século XIX Caspar David Friedrich, com a neblina que contribui para a atmosfera de mistério e hipnotismo de seus filmes.
Afrontar diretamente o público. Em filmes como Sinais de Vida, Também os Anões Começaram Pequenos, Fata Morgana ou My Son, My Son, What Have Ye Done!, entre muitos outros, as personagens ou as pessoas, ou ainda animais como uma galinha, um gato ou um lagarto encaram a plateia, rompendo a quarta parede para afrontar o público, tirá-lo de sua passividade. Lembremos de Aguirre, a Cólera dos Deuses, em que o personagem título tem o famoso monólogo em que se afirma como a cólera dos deuses olhando diretamente o espectador, segundos depois de ter ordenado o corte da cabeça de um oponente.
O burlesco. Em Fata Morgana, filme-súmula, dois homens procuram instruções sobre a movimentação que devem fazer. A câmera os flagra na indecisão, e os captura encabulados, risonhos, como comediantes do burlesco. Em Coração de Cristal, alguns enquadramentos fixos com os atores respeitando marcações bem definidas remontam a um burlesco distorcido, assim como o momento em que o cão vampiro pisoteia os dois homens desfalecidos para que se descubra qual ainda está vivo. No início de Woyzeck, Klaus Kinski aparece correndo em câmera acelerada, seguindo a ordem de um oficial que o obriga a algumas posições de sentido. Rápida invasão do burlesco em um filme que terminará em tragédia.
O documentário. O cinema moderno diminuiu, e por vezes até aboliu, as diferenças entre ficção e documentário. Isso já estava evidente, conforme escreveu André Bazin, no Jean Renoir dos anos 30, essa década importantíssima para a evolução cinematográfica. Mas está presente também em hollywoodianos como John Ford e King Vidor. Em Herzog, o documentário está sempre presente, seja em filmes híbridos como Fata Morgana, cuja roupagem documental não esconde a maneira ficcional da abordagem, seja em um poema filmado como Coração de Cristal, que mais parece um falso documentário sobre uma civilização perdida.
A relação com a música. Para além da parceria com a banda de rock progressivo Popol Vuh, essencial para a atmosfera hipnótica de alguns filmes, há um interesse genuíno de Herzog por performances musicais, que podem ser vistas já no início da carreira, em Fata Morgana e no curta Últimas Palavras (1968). Em Aguirre, a Cólera dos Deuses, os flautistas têm a função de fazer com que todos esqueçam temporariamente que estão em uma missão suicida. Em O Enigma de Kaspar Hauser (1974), o interesse pela música captura o protagonista para uma vida em sociedade que será sua ruína, mas garante momentos de doçura ao cravo. As flautas tocadas pelos índios ameaçam o sonhador de Fitzcarraldo. As mulheres de uma aldeia entoam canções de impressionante força para a câmera em Cobra Verde. E muitos outros exemplos poderiam ser apontados. Herzog já declarou que algumas de suas maiores influências vêm da música, e seu estilo passa necessariamente pelo casamento entre música e imagem, conforme nos mostram os dez minutos iniciais de Coração de Cristal, sua obra-prima.
Breve conclusão
Werner Herzog é de uma geração privilegiada, que entendia a arte como uma forma de criticar alguma coisa (como dizia Fritz Lang). Rever seus filmes, hoje, é fundamental para uma nova geração de cineastas acostumados a encaixar seus filmes ou projetos em fórmulas para festivais ou aceitação crítica, quando o único caminho possível é seguir uma inquietação particular e forte, que deve guiar o coração e a mente do artista pelo único caminho possível que ele pode tomar. A possibilidade de (re)ver filmes magníficos como Fata Morgana, Aguirre, a Cólera dos Deuses, Coração de Cristal, La Soufrière, Nosferatu ou Lições de Escuridão é também a possibilidade de pensarmos no que se perdeu e no que pode ser recuperado de uma era em que o cinema ainda fazia valer a denominação de sétima arte.
NOTAS:
1- Sempre bom lembrar que o cinema moderno implodiu boa parte dos limites que separam ficção e documentário, e que Herzog chegou a dizer que não acredita nessa divisão (“Fitzcarraldo é meu melhor documentário”). Herzog também é espirituoso o suficiente para promover uma pequena e adorável confusão ao chamar, por exemplo, Fata Morgana e Lições da Escuridão de filmes de ficção científica.
2- Consta que Herzog buscou desde o início fazer um filme hipnótico. O cineasta Joel Yamaji conta que viu o filme três vezes no cinema à época, e que dormiu no mesmo momento, nas três vezes, justamente o momento das quedas de água com a música do Popol Vuh, ainda no começo do filme.
3- Há a internacionalização de fato, de produção, pelo qual passou boa parte do cinema alemão durante os anos 70, retomando a tradição da cinematografia alemã de olhar para fora, desde os tempos da UFA, com um longo hiato nacionalista entre as décadas de 30 e 60. Em Herzog, ela fica clara em Nosferatu, produção franco-alemã falada em inglês. Mas há também a internacionalização como tema, presente com força nos seus filmes dos anos 1970, e mesmo antes. Herzog filma na Grécia (Sinais de Vida), no deserto africano (Fata Morgana), na floresta amazônica (Aguirre, a Cólera dos Deuses, Fitzcarraldo), no Alaska e na Irlanda (Coração de Cristal), nos EUA (Stroszek), na antiga Checoslováquia (Nosferatu, Woyzeck), e mesmo quando filma uma trama completamente alemã, o exterior aparece em sonho (Kaspar Hauser sonha com os beduínos no deserto).
SÉRGIO ALPENDRE é crítico de cinema, professor, pesquisador e jornalista. Escreve na Folha de S. Paulo desde 2008 (Ilustrada, Mais, Guia Folha e Guia livros, discos, filmes). Doutorando em Comunicação/Cinema pela Universidade Anhembi-Morumbi e Mestre em Meios e Processos Audiovisuais pela ECA – USP. Coordenador do Núcleo de História e Crítica da Escola Inspiratorium. Edita a Revista Interlúdio (www.revistainterludio.com.br) e o blog de cinema sergioalpendre.com. Foi oficineiro do programa Pontos MIS (de 2012 a 2015). Fundou e editou a Revista Paisà, publicação impressa de cinema (de 2005 a 2008).